
Cineasta diz que a sequência do filme de maior faturamento da história mostrará a necessidade de encontrar um equilíbrio entre desenvolvimento e meio ambiente
Por Diogo Schelp
Foto: Ethan Miller/Getty Images
O cineasta canadense James Cameron, de 55 anos, é o criador de alguns dos maiores sucessos do cinema, como O Exterminador do Futuro, Aliens, Titanic e, recentemente, Avatar, uma produção de mais de 300 milhões de dólares que ultrapassou a marca de 2 bilhões de dólares de faturamento em venda de ingressos. Cameron planeja dar sequência a Avatar. Profeta da tecnologia aplicada ao cinema e dono de um dom quase infalível para saber o que fará sucesso entre os espectadores, Cameron também tenta ser um visionário do meio ambiente. Ele esteve no mês passado no Brasil para participar, em Manaus, do Fórum Internacional de Sustentabilidade, realizado pela Seminars e promovido pelo Lide. Aproveitou a ocasião para sobrevoar pela primeira vez a Floresta Amazônica e conhecer a região onde será construída a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Xingu. Após a visita, decidiu organizar uma campanha internacional contra a usina. Cameron concedeu a seguinte entrevista a VEJA.
Avatar valoriza experiências sensoriais como entrar em uma floresta cheia de flores coloridas ou sentir a terra sob os pés nus. A humanidade esqueceu como apreciar essas sensações? Sim. As pessoas estão se afastando não apenas da natureza, mas do contato humano. Os jovens têm as suas interações sociais on-line, em vez de pessoalmente. As aventuras acontecem em jogos de computador, não mais fora de casa. A interação com a realidade, com outras pessoas e com a natureza está diminuindo. A tecnologia permite isso.
O senhor, contudo, é o diretor de cinema que mais usa tecnologia no mundo. Como explicar esse paradoxo? De fato, é um paradoxo. Eu sempre tive uma relação de amor e ódio com a tecnologia. Durante as filmagens de Avatar, os atores tiveram de entrar em contato com o lado mais primitivo de si próprios e, ao mesmo tempo, atuar nas condições mais high-tech possíveis. Para dar uma ideia da tecnologia envolvida, este foi o primeiro filme a demandar uma memória de 1 petabyte (1 milhão de gigabytes) para ser armazenado. Para processar as imagens digitais, na Nova Zelândia, tivemos de desenvolver o computador mais potente do Hemisfério Sul. Ou seja, não podemos ser ludistas e afirmar que toda tecnologia é ruim. A solução para salvar nosso planeta também passapelo uso da tecnologia. Por isso, penso que, antes de construir uma hidrelétrica como a de Belo Monte, no Pará, por exemplo, o governo brasileiro poderia buscar outras saídas para atender à necessidade de energia do país. Todo projeto de represa com um impacto negativo sobre os moradores da região deveria ser evitado. A alternativa, no nível nacional, pode ser aumentar a eficiência no uso de energia nas cidades.
Em Avatar 2, o meio-termo entre economia e meio ambiente será encontrado? Sim. O próximo filme não deverá ser tão preto no branco quanto o primeiro. Durante uma projeção de Avatar no Equador, a anciã de uma tribo indígena criticou o filme por escolher a violência como solução para o conflito ambiental. Por isso, pretendo mostrar, na continuação da obra, que as partes têm de chegar a um acordo. Outras questões a que Avatar 2 e, talvez, Avatar 3 precisam responder: a humanidade pode ser salva? O modo de vida dos Na’vi (o povo azul que habita Pandora, a lua fictícia do filme) pode transformar o planeta Terraou estamos condenados? Os seres humanos serão capazes de absorver as ideias poderosas de Pandora e aplicá-las à própria vida, de maneira a recuperar tudo o que perderam? Em outras palavras, os Na’vi podem ter uma mensagem de esperança para nós, terráqueos? O primeiro Avatar é apenas o tiro inaugural de uma gigantesca batalha de ideias e civilizações.
O que mais haverá de novidade no próximo filme?
Ele se passará parte em terra, parte em um ambiente subaquático, em um oceano.
Como foi perder o Oscar de melhor filme para Guerra ao Terror, um filme muito mais barato que o seu e ainda por cima dirigido por sua ex-mulher, Kathryn Bigelow?
Pessoalmente, tive sentimentos contraditórios. Senti alegria e tristeza pela escolha do prêmio. Eu estava desapontado pela equipe do filme, que tinha uma grande expectativa em relação ao prêmio. Por outro lado, Kathryn e eu somos amigos e colaboradores há muito tempo. Emocionalmente, significou muito para mim vê-la ganhar. É a primeira vez que uma mulher ganha como melhor diretora. Foi ótimo que tenha sido ela. Dito isso, os dois filmes abordam de maneira bastante diferente uma questão política: a guerra no Iraque. Avatar tem uma mensagem clara contra o uso militar para fins imperialistas. Não está certo enviar soldados para matar iraquianos a torto e a direito apenas para garantir o fornecimento de petróleo. O filme de Kathryn não discute isso, mas mostra o trauma psicológico que a guerra causa nos soldados. Um grande fator que levou Avatar a perder o Oscar é o fato de o filme ser tão deslumbrante visualmente que os membros da Academia não deram muito crédito à história.
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